AMEAÇA GRAVE

Crise no Samu em MG: 'Faltar recurso é perder qualidade e ver mais gente morrer', diz consórcio

Entidades preveem déficit de R$ 56,8 milhões nos repasses ao Samu em 2025, e condutores socorristas pressionam por greve

Isabela Abalen/O Tempo
Publicado em 02/07/2025 às 17:25
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“Quando você não tem ambulância funcional, equipamento de qualidade, condutores bem treinados, o tempo de resposta em uma ocorrência aumenta. A pessoa está infartando, como faz? Sem recurso, a qualidade do serviço cai, e isso significa mais gente morrendo.” A declaração do secretário do Consórcio Intermunicipal de Saúde da Macrorregião do Sul de Minas (Cissul), Felipe Batista, ilustra a preocupação da categoria com o desequilíbrio financeiro do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência Pré-Hospitalar de Minas Gerais (Samu 192) relatado ao Ministério da Saúde (MS), conforme ofício encaminhado ao órgão. 

Dez consórcios do Sistema Único de Saúde (SUS) projetam um déficit de R$ 56,8 milhões no custeio do Samu 192 em Minas em 2025, e uma mobilização ameaça iniciar uma greve em todo o Estado. O Sindicato dos Trabalhadores da Saúde de Minas Gerais (Sindsaúde-MG) já contabiliza ao menos 2 mil condutores socorristas cobrando por melhores salários.

No levantamento financeiro do Cissul, o consórcio afirma receber, mensalmente, 28,39% da verba da União (R$ 1,8 milhão), apesar de a regulamentação prever 50% de participação do Ministério da Saúde. O resultado, segundo a denúncia, é um rombo que pode chegar a R$ 9 milhões até dezembro no caixa do Samu do Sul de Minas — que atende 153 cidades e alcança cerca de 2,6 milhões de pessoas. “O Estado já está arcando com mais de 50% do investimento; não dá para sobrecarregá-lo ainda mais. Também não dá para o município assumir. A União precisa fazer a parte dela”, afirma o secretário do Cissul, Felipe Batista.

Ele explica que a falta de repasses adequados compromete o desempenho geral do Samu, precarizando o estoque de medicamentos e equipamentos do serviço, a manutenção das ambulâncias e a compra de combustível, além dos salários dos socorristas. “Todos os itens fornecidos são reajustados anualmente, de acordo com a inflação, e os nossos valores não acompanham esses aumentos. Alguns consórcios estão em uma situação muito difícil”, relata.

Ao menos duas reuniões já foram realizadas com o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, mas, conforme o secretário do Cissul, ainda não houve tratativas diretas. Ele afirma que o MS promoveu algumas melhorias no setor, como a renovação da frota de ambulâncias, mas ressalta que o valor do investimento ainda é insuficiente.

“As contas estão chegando. Estamos em sinal amarelo, alertas para esse colapso que se aproxima. Não sabemos se conseguiremos sustentar o serviço durante todo o próximo ano sem reajuste. O Samu pode ser o último recurso para salvar uma vida — é urgente. Se não houver avanço, a consequência virá”, alerta.

"Não dá mais para permanecer calado", diz condutor socorrista

Uma das principais frentes que pressionam por greve no Samu de Minas Gerais é formada pelos condutores socorristas das ambulâncias, que recebem os salários mais baixos da equipe — cerca de R$ 1.800. Enquanto os consórcios intermunicipais de saúde alegam dificuldade para contratar esses profissionais, a categoria reclama de jornadas exaustivas e da falta de valorização.

“Como condutor socorrista, eu apoio totalmente uma paralisação. Somos linha de frente, arriscamos a vida todos os dias, com risco de acidentes, porque trabalhamos exaustos. Precisamos de dois vínculos trabalhistas para tentar ter uma vida digna. O salário está defasado, não temos reconhecimento, somos invisíveis. Não dá mais para esperar calado”, desabafa o condutor socorrista da região Central de Minas, Frederico Almeida.

A categoria alega que participa ativamente dos resgates e está exposta aos mesmos riscos biológicos que os profissionais de saúde. Por isso, cobra a retomada da votação do Projeto de Lei 3.104/2020 na Câmara dos Deputados, que propõe incluir a função no quadro de trabalhadores da saúde.

Condutor socorrista há quase 10 anos, Edymar Abreu, de 53 anos, se queixa de uma jornada "agonizante". “É um trabalho exaustivo, que não é valorizado. É uma vergonha o salário não sustentar uma família. Dirigir uma ambulância é o que menos fazemos. Somos treinados e participamos do resgate, auxiliamos na mobilização da vítima; em casos de fratura, fazemos contenção do sangramento do paciente; participamos das manobras de reanimação. Somos parte da equipe”, afirma ele que trabalha na Zona da Mata mineira.

Edymar relata que já começa a notar colegas desistindo da profissão. Segundo ele, cerca de 2 mil condutores socorristas estão unidos na pressão por paralisação, aguardando alguma tratativa das gestões. “A preocupação é se chegar a verba que o Samu precisa, mas ela for absorvida por outras despesas dos consórcios, deixando de melhorar nossos salários. Precisamos disso”, diz.

O que diz o MS e o governo do Estado? 

Na última visita a Minas Gerais, em 16 de junho, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, foi questionado sobre o levantamento dos consórcios de saúde que aponta repasse insuficiente de verba ao Samu. Ele afirmou que irá investigar a situação, mas negou que exista um valor mínimo a ser obrigatoriamente cumprido.

"Primeiro, é mentira que exista um piso constitucional para o Samu. O último reajuste do Samu no Brasil ocorreu quando eu fui ministro, em 2012 e 2013. Depois disso, ficaram dez anos sem reajuste do Ministério da Saúde para os Estados e municípios. Com a volta do governo do presidente Lula, foi feito um reajuste de mais de 30% nos recursos. Vamos acompanhar essa situação em Minas, mas não vamos dialogar com mentiras", cravou Padilha. A reportagem demandou o MS e aguarda retorno. 

Por outro lado, a Secretaria de Estado de Saúde de Minas Gerais (SES-MG) argumenta que a divisão do custeio do Samu no Estado é regida pela Portaria nº 1.010/2012, que estabelece que o Ministério da Saúde é responsável por 50% da verba; o Estado, por no mínimo 25%; e os municípios, por no máximo 25%. “Atualmente, o Governo de Minas repassa até mais de 50% dos custos informados pelos consórcios, superando o percentual mínimo estabelecido. A SES-MG reforça seu compromisso com a manutenção dos serviços de urgência e emergência no Estado”, afirmou a pasta.

Fonte: O Tempo.

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